terça-feira, 16 de março de 2010

Encontro

Foi outro dia, estava lá, quieto, quando lembrei que, quando era criança, eu sempre olhava muito tempo para as coisas simples da vida... que subia na árvore e sentava nos seus galhos e olhava as formigas passarem, ou senti-las me morder. Que olhava longe, achando que aquele mundo era tão enorme – ali a “avenidona” que a gente pega quando vem da minha avó, e tinha tudo aquilo mais! Às vezes a noite caía, então me encolhia um pouco naqueles galhos queridos, generosos, protegido que estava de olhar a noite assim, no alto, na cara dela. Descia com fome, e comia: não precisava de mais nada. O tempo não contava para mim, não o sentia. Só eu era para mim. Só a minha companhia. Nada me cobrava, nem culpava, ingênuo, puro.
Então, me convidei a ver o sol se pôr, o dia sumir, a noite chegar. Então cheguei, sentei-me no chão, no quintal, no caminho das formigas. Eu trouxe bolinhos de chuva, com banana dentro, passados no açúcar com canela, recém saídos da frigideira. E eu estávamos tão felizes, que respirávamos profundamente. E comecei a ver as pequenas coisas, as despercebidas... olhei as rachaduras nos meus muros, os defeitos do piso no chão do meu quintal... as folhas rasgadas das palmeiras, sujas, outras secas... o céu nublado, cheio de imperfeições e saliências de nuvens cinzentas... meu corpo envelhecido, seco de quando em quando, a idade que não tinha última vez que aqui estive.
Eu estava bem... nada enfim precisava ser consertado, tudo é um ledo engano meu, conspiração minha - medo afinal. Eu me levanto e sigo. Eu fico, deitado, sobre o chão.

Francisco Vieira
16/03/2010