terça-feira, 20 de abril de 2010

Cena do beijo, roubada Ato III – O pacto Ato IV – Os amantes

- ... não me largas as mãos
Ante estas fugidades?

- Não, ainda não,
Não sem antes amar-te mais um pouco...



Francisco José
20/04/2010

Cena do beijo, roubada Ato I – Os amantes Ato II – O respeito


- ... então dessa forma fica exposta
A enormidão da minha fragilidade...

- Sim, eu a vejo, e a seu tamanho,
Mas não sem a presença de muito respeito,
Amor e gratidão a esta fragilidade,
Por ter te moldado tal qual és!...



Francisco José
20/04/2010

domingo, 18 de abril de 2010

Eu estou cansado de ficar preso nessa vida


A Augusto dos Anjos


Quando a noite não te trouxer,
Qual exatamente é a atitude que eu devo tomar?
Devo cortar minha carne, quebrar meus ossos, romper minhas vísceras
Na fuga vã de uma suposta vida eterna?
Devo chorar na parede o triste fim de um começo,
Cujo começo eu nem pude conhecer?

No sofrimento dantesco que minha face projeta,
A luz de um sol infeliz a queima,
Suga-me a alma através dos olhos, dilacerando-a,
Partícula por partícula.

O meu corpo reverbera a situação de uma violação,
A dor escapa gorda e apertada dos meus poros,
A dor que dói músculo por músculo, ao mesmo tempo,
Nos ossos, nas pernas, nas orelhas...

Embate inglório do Prometeu contra as aves,
Que por fim deseja ardentemente que não lhe cresça mais o fígado!

O triste mar que escoa
No buraco mais fétido e escuro do canto do quarto:
Tenazes sutis, sensuais, cinistras, silenciosas,
Capturam os esforçadíssimos sonhos nascidos em plena crise da enxaqueca.

Mudas mãos emudecentes, pontiagudas, sádicas,
Que prometem carícias, carinhos, amores:
Mas que não cumprem e ainda se insinuam,
Insugerem-se, delineiam-se,
Mas não cumprem
Nem matam.

Azaléias corrosivas, cáusticas, químicas,
Aromatizam a agonia de eu pouco respirar...
Por tudo lama, tudo aflição, tudo crime:
Esquartejados, vencidos e sobreviventes,
Confinados no mesmo espaço afobiante
Pus, sangue, lágrima, edema, cuspe, terra, horror
- Em cada vaso uma vingança, em cada frasco uma ira.

Ajuntai-vos pois desgraças glórias que me perfazem o destino,
Tomai novo fôlego, aprumai vosso esqueleto, sacudi a musculatura,
Incuti mais força na empunhadura dessa espada,
Enfiai-ma mais fundo, dentro do ser, brandi-a
Porque não sou, nunca vou ser,
Aquele que esperaram que eu fosse.



Francisco José
18/04/2010

sábado, 3 de abril de 2010

Carta a uma amiga companheira de viagens natalinas

Eu não gostaria de que te afugentasse o parentesco que carrego no sangue,
De carregar esse estigma e sofrer a tua ausência, o ólvido, a sua quase desamizade...
A vida foi injusta ao colocar as coisas assim, me dá com uma mão, me tira com a outra
Uma amizade que só não é mais sólida porque capenga aqui, coxeia, tropeça, engasga...

Mas o meu compromisso é com as águas verdes que se agitam desde o horizonte,
Com as brisas que sopram desde longe essas mesmas águas, com o sol que se vai,
Com as gaivotas que se despedem, e se riem, e se soltam eu aqui na praia sentado,
A liberdade da maresia se desprendendo, o gosto de sal no ar, com o que se cala no meu peito.

Assim, nada exijo de você... ao contrário, aceito a superficialidade dos nossos desencontros,
e quiçá vibro quando acontecer de, numa dessas evoluções, calharmos de nos reencontrar
nas nossas profundidades, das nossas alegrias, das despretensões largadas nossos braços, pernas,
pois a minha felicidade não depende da sua presença, mas a enfeita, de um jeito tão mimoso...

Perdoe-me o conteúdo um pouco amargo dessa carta, fruto de uma tristeza um tanto revoltada...
Perdoe-me as conclusões antecipadas, mas preciso de chão, e você não me deixou explicações...
De nada reclamo ainda, nem das desculpas que você cala, nem das suas ausências, nem de nada,
Apenas expresso a dor que está lá por eu não ter sido escolhido, mesmo sabendo que ninguém foi.

Eu estou renascendo nesse sábado de Aleluia... renasci com essa verdade ereta, visível, gritando.
Talvez nossas estradas se afastem mais, os interesses sejam mais diferentes, e nos percamos de vez...
Talvez tenha que ser assim. E vou respeitar sua retirada, seus motivos, os que não sei inclusive...
Não sem tristeza, mas com respeito, com reverência, com afeto, estou arrumando minha gaveta.

Francisco José
03/04/2010