quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Ádurà








O encantamento parte do princípio
de que o outro está aberto a se encantar.

O encantado é uma Fênix que está se ardendo
de quando em quando, na loucura de amar-se
a si mesmo.

O encantador é aquele que dispõe, decide e manda,
na tua vida orgânica, que a possui, desde agora.

O encantamento é doce, macio e tênue aos olhos,
todo construído de cores suaves e convidativas, úmidas,
que se serve numa tigela respeitada, sacra, e se lhe põe aos pés.

O encantamento é apenas um acessório que se leva
à frente de si, para chamar a atenção ao que mais importasse,
que se edifica por trás do encantamento, sereno,
observando a vítima do seu lento envenenamento.

O encantamento é a via por onde genuinamente nossos
corações podem se tocar, sem nenhum atravessador.

O encantamento é a vontade imperativa de se querer mais,
de alguma coisa que ainda não se deu por inteiro.

O encantado morre, frequentemente,
atropelado pela própria dúvida, que o ultrapassa,
quando ele engasga no beijo mais delicado e entregue
que ele recebera assim, sem nunca lhe ocorrer...

O encantamento liberta, entre estes arbustos e flores,
nesses córregos, nesses pássaros, nesses saguis,
cobertos por uma imperceptível rede.


Francisco Vieira
19/01/11