quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Caim




 


Eu posso me sentir desnudo na sua frente. Pode ser que eu me sinta tão gelatinosamente frágil e "vulnerável" (Isabelle D'Avila), tão à merce da sua misericórdia inexistente, que eu acredito que você poderá com certeza me violentar, agressivamente, com suas atitudes e agressões verbais e físicas, que posso mal interpretar como sensualidade e então, minha frágil constituição psíquica pode não saber lidar com essa carga de excitação. Minhas vísceras doem. É o carinho que você me dá. Eu não tenho mais que quatro anos. Eu vou procurar relacionar-me com homens violentos como meu pai. Seja eu homem ou mulher.



Na Praia do José Menino, em Santos/SP, durante essa tarde que tarda cair.



Francisco Vieira
29/12/2011


Foto disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/O_Grito em 29/12/2011

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Distorções e Torções






Escuta aqui,
eu cheguei,
não tinha patavinas
de acontecer nada daquilo
que o ócio pudesse
me fazer regurgitar
no meio daquela explosão
que se chama,

quando o baile começa
e as mariposas estão se bailando
em torno dos fachos
e chega a orquestra,
instrumentos na mão:

vai começar o Alvorecer?






Francisco Vieira
21/09/2011

Imagem disponível em http://tinyurl.com/3lkh7qt em 2l/09/2011

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Suspiro







Óh vento intruso,
que segues forçando portas,
maçanetas,
onde está o dia em que tu
cessarás
de soprar
insistentemente
as coisas todas
que eu não consigo reter?




Francisco Vieira
31/08/2011

Imagem disponível em http://tinyurl.com/6eus7az em 31/08/2011

Caramelo




“O mito é o nada que é tudo”
Fernando




Eu posso estar morto.

E pode ser que esta suposta vida,
seja apenas a alucinação momentânea,
vivida no tempo que eu quiser,
resultado de uma pane elétrica,
causada no meu cérebro,
antes dele morrer.

Pode ser que nada disso seja realidade.
Pode ser que eu apague sem um fim aparente,
um fim que comunicasse,
pois pode ser que eu cometa o deslize
de não imaginar um fim,
dentro do tempo inexistente de uma faísca.

Tudo é essa viagem.




Francisco Vieira
31/08/2011

Imagem disponível em http://tinyurl.com/4ykc4ph em 31/08/2011

domingo, 21 de agosto de 2011

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Sabe que eu tenho medo?
daquelas horas vagas onde se estende
feito lençol pesado e puído
o silêncio que transborda tudo.

Quando então em nossa intimidade
nós dois, eu e tu, demônio, quando
então o deserto enorme onde vivemos
nos desencontrando
fica pequeno, e nós temos a oportunidade
de olhar
frente a frente nos nossos olhos uns dos outros.

Minha angústia de sempre,
é a dúvida se vou te vencer esta vez,
inda mais ultimamente onde venho
desesperadamente
entendendo que tu sempre te deixas vencer.

Esse desespero que observas,
naturalmente na maior facilidade,
nasce da dúvida entretanta de que
muita maldade eu vejo em ti
não exista realmente no teu coração.

Que inclusive não é assim
tão duro nem pesado teu olhar,
nem tão hostil a postura,
então assim enquanto eu vou parando,
para respirar.

Para que eu quisesse sentar
no chão,
para que eu quisesse descansar,
e talvez chorar,
por tanta energia gasta
num engano tão convincente.



Francisco Vieira
21/08/2011

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Danos, Panos, Manos




O óleo se escorrre
da tua face
no momento em que eu mais preciso dela,
do seu olhar,
da certeza erigida
na visão exata que imagino ser
sem a gordura que pinga das dobras da tua cara.

Pau de ferro, bem-te-vi,
faca-cega, lima, peru - brucutu:
“a imagem do cruzeiro resplandece” no centro do cemitério
- por sobre onde a pomba pisa.
Onde ali ela defeca.
E voa,
para fins mais
imprevisíveis.



Francisco Vieira

17/08/2011



Imagem disponível em http://tinyurl.com/3u4uzbt em 17/08/2011

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Cadeias




Cadeias

Eu sou completamente enclausurado:
o amplo céu me enlaça com fitas de vento,
coloridas, ao capricho da incidência da luz.
Também acordo, enquanto os pássaros entoam a sinfonia
do alvorecer, saúdam o dia, lembrando que são felizes.
Desafino entre a exata distância afora o contato da pedra com o vento
que a lambe...
eu não posso imaginar ser livre, porque as ameaças de alegrias
e prazeres no fim do dia, no clímax do sol declinando, entardecendo.
Torno-me mais preso ainda, atado pelas mais abscônditas fímbrias,
por essa incerteza que certamente invade meu espaço antes povoado pela luz.
Envolvo-me então de seres alados
que protegem e estreitam um pouco mais
as cordas nos limites da minha existência.

Não meu irmão, Deus o livre de ser livre...


Francisco Vieira
27/07/2011

Disponível em http://tinyurl.com/3obg7jl em 28/07/2011

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Projeto A





Talvez amanhã eu decida quem sou,
se por acaso não me distrair
correndo no campo de camomila,
deitado na sombra,
escalando uma cachoeira,
nu,
bebendo vento, bebendo água.

Pode ser que eu saiba definir-me amanhã,
não por puro clichê, que é uma convenção,
- enquando estiver pulando, eu e um cão,
um periquito, uma eventualidade,
enquanto o arco íris se exibe,
enquanto a pedra molha,
se eriçam pelos e ereções.

De qualquer maneira, continuemos
nosso incerto colóquio amanhã,
porque naquela flor,
que o beija-flor deseja,
já brotou líquida a doçura
que atrai borboletas,
abelhas e tanta alegoria!

De qualquer maneira, não sei
ceder ao teu desejo de me conhecer,
mesmo quando afirmas me conhecer,
porque nem mesmo posso validar
o teu conhecimento sobre mim.
E quando explicas tuas razões,
varrem pesadas nuvens
o frio vento da tristeza,
que sopra a boca torta da decepção,
no meu mundo cheio de espontaneidade.

Então, não tente dizer
no lugar onde eu não digo
a verdade sobre mim.
Ela não existe:
é construída dia a dia.
Deixe eu repousar na minha
desabedoria.



Francisco Vieira
20/07/2011

Imagem disponível em http://tinyurl.com/3m3nxv7 em 20/07/2011

Feitio de Oração



Benditos vós, que vos expressais por palavras,
que fizeram, do som, uso para articular pensamento,
que conseguis comunicar vosso mais profundo e pequeno medo.

Vós, que tendes vos esmerado em buscar a mais preciosa expressão,
que vos contendes de ansiedade enquanto a pedra bruta vai tomando forma,
brilhando, sem a menor mácula aparente...

regozijai-vos que vos surpreendeis com a entrada súbita da brisa,
trazendo um aroma refrescante de folha úmida,
e podeis falar sobre isso, com a exatidão de um aprendiz.

O que era antes disso, antes de poderdes desenhar assim,
a nível de lousa neuronial, da maneira mais clara e lúcida,
os desenhos das sutilezas de sentimentos inerentes a vós...?

Porque assim sois, transformados, de bestas comuns,
que apenas grunhiam sentimentos óbvios e sem fundamento,
em Homens leves, tão leves quanto as imagens que podem criar,
compondo-as com palavras.

Paragens azulíneas transparentes, flutuantes,
como fumaça moldada qual argamassa fosca,
pairam azuis gasofilácias, e se espalham com um sopro!

Benditos vós que comunicais exageradamente vossos sonhos,
que abris aos ventos vossos anseios nos corações descontidos,
vós que sois honestos e que alimentais a verdade a qualquer preço!





Francisco Vieira
18/07/2011

Imagem disponível em http://tinyurl.com/3w5hbf6 em 18/07/2011

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Balé Sensorial







Aprendi uma saudade,
que vem num impulso de onda,
e retorna toda salpicada de espuma,
para então recomeçar um novo ciclo...

assim como a tristeza sonolenta do fim de tarde
queda muda no silêncio da noite,
é uma saudade que dorme na certeza
de que outra aurora trarás quando retornares...

longe daquela saudade aterradora
que não conhece companhia,
e que se fixa na ilusão
de que, junto com o outro, ela desaparece!

Mas não a tua presença!

Pois que quando comigo, juntos,
esclarecendo desejos e elogios,
falando baixo, no lábio do outro,
funde-se em meu coração uma energia

cálida, quase como um magma
preenchendo uma fenda na rocha fria,
a tua presença que percebo por todos
os sentidos, me superpreenchendo...

uma saudade que eu gosto de sentir,
porque é supérflua, é desnecessária,
porque me faz pensar em ti,
e porque gosto de pensar em ti.



Francisco Vieira
08/07/2011

Imagem disponível em http://tinyurl.com/3kaeoaw em 08/07/2011

Diário de bordo






Pleno



Não há nada que eu escute mais
do que o que é dito diretamente aos meus olhos,
olhados pelos olhos teus.

Quando o som que ouço
ao murmurares “eu te amo!”
de maneira tão simples e aberta,
é um objeto ínfimo
na disposição dos móveis e complementos
da sinceridade e da honestidade
desse olhar.

Na verdade é essa a casa onde eu moro,
aquela que vislumbro a partir do que vês de mim.

Não há dependência nossa, ambas,
da existência dessa casa morna, acolchoada,
mas assim que chegamos lá, ela, se materializam,
mutuamente, e assim nos deixamos ficar
simplesmente conversando,
pelo olhar, lendo os lábios, o som desligado.

Esta é uma ilha
que conquistamos além do frêmito
e do choque do encontro, por onde nadamos,
braçadas e respiração profundas,
nossos corpos se esforçando e se empurrando contra o outro.

Um momento de descanso
dentro de um momento de prazer.

Uma fatia de felicidade.




Francisco Vieira
07/07/2011

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quarta-feira, 6 de julho de 2011

Sombra











Seja bem-vindo você que não me vê,
que esconde meu rosto por trás às sombras,
aos arvoredos noturnos enegrecidos pela noite,
mas que buscam a claridade se enraizando
fora de terra, dessa vez:
por entre a claridade dócil da lua cheia.

Você, que me vislumbra nos becos, nas dobras,
com os olhos súplices, desesperado,
quando por ventura algum relâmpago vem me nascer.

É que quando nos sonhos profundos, quando então
temos a chance de nos relacionarmos mais de perto,
quando enfim você vem a meu encontro
e vomita o alimento azedo que me sustenta,
é que eu tenho a oportunidade de dizer-lhe
que minha maior intenção sempre foi parecer com você,
e que minha maior decepção foi você ter se tornado
a pessoa que mais se parece comigo.

Enojado, mal posso disfarçar minha repugnância...
e busco junto ao calor dos fogos-fátuos meu abrigo,
o descanso para a minha cabeça que nunca se consome em fogo.

E essa ilusão de me esconder,
é um véu sobre a verdade,
sob onde quem se esconde sou eu.



Francisco Vieira
07/07/2011

Imagem disponível em http://tinyurl.com/6eus7az em 07/07/2011

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Circuitos Elétricos





A você, amigão!




O meu corpo me ruge com uma excitação lasciva,
como se fosse uma besta, à qual eu devesse dar rumo,
que fala nos meus diálogos mais íntimos,
que me clama nos mais íntimos descansos,
nos suspiros, espreguiçando, esticando, bocejando...

eu que converso assim, abertamente, sem nenhum limite,
entre meus diversos diálogos, bailarinamente,
inclusive nas pausas que se coincidem num silêncio profundo...

eu que caio, em mim, e me resgato antes do encontro
no chão,
em mim eu me lanço abaixo e me alcanço
e acho em mim mesmo a exaustão das minhas energias
brincando.

Mas esse diálogo cessa quando próximo do teu corpo.
Eles conversam numa linguagem muda e toda sensitiva
que desconheço, toda cheia de reações e aproximações,
e se queimam e se ardem como fogo e oxigênio
onde nossos corpos, como lenhas contorcidas e grudadas,
são a base do nosso encontro onde ardemos nossas almas...

é quando então nos cristalizamos no meio líquido do mel,
lá juntinhos, transformando, sentindo-nos trincar em açúcar,
dentro da nossa respiração onde inspiramos o outro até o coração.

Eu calo no teu corpo.





Francisco Vieira
01/07/2011

Imagem disponível em http://tinyurl.com/6xtv573 em 01/07/2011

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Luxo






Por que a ausência me termina num sopro de vela?
Que lágrima me escorre que não vejo aqui?
Onde o bálsamo me permite, seja eu o mais reparado?

Enquanto o sol houver de secar as cascas das sementes,
enquanto elas incham mais, fazendo-as explodirem,
se invadindo no espaço das futuras árvores,
ocupando seu lugar de direito, eu estarei muito bem.


Francisco Vieira
15/06/2011


Imagem disponível em http://tinyurl.com/3t5u3xo dia 15/06/2011

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Água Marinha






Eu tenho um luxo em mim
que se escorre feito mel,
pelos meus pelos nas pernas,
entre os dedos que é pregando no chão
que se anda impreciso sobre o doce.

É porque os contornos marinhos nas praias
de um vento soprado úmido, salgado,
no pôr do sol que se espreguiça
sentado e deitando nas areias e conchas,
são perfeitos e movimentados, como que brilhassem.

É igual à rocha, que escorre lisa, no maior prazer,
nas praias onde ousam colocar-lhes as pontas,
cuja vida é a festa da luz, do calor, da espuma, do frio,
e um beijo frequente e perene da brisa que se sopra...

Esse é o luxo que se encanta em mim nu,
na praia no sol num beijo de luz,
entre aquela excitação de sentidos
e o mais nada, nada do eu que pudesse prover.

É porque é um contorno de formas sutis,
daqueles morros do sol poente, azulando-marinho,
na areia onde aí somente eu posso me recolher,
- eu que estive exposto durante todo o dia de luz -
apenas nas radiações simpáticas do argênteo.



Francisco José
10/06/2011


Imagem disponível em http://tinyurl.com/6ezljqm em 10/06/2011

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Luz e Treva










“Ela é de Capricórnio, eu sou de Libra
eu sou o Oxalá velho, ela é Inhansã
a mim me enerva o ardor com que ela vibra”

Vinícius de Moraes




Ficas aí agora, onde te vejo assim,
em contorno e cor e luz, e surpresa,
agora que te olho nos olhos.
Nunca passou-te pela cabeça que tens
pudesse eu um dia enxergar-te?
Esse ser fétido e cheio de feridas,
de boca medonha, onde nunca houvesse
outra expressão senão o deboche?
Enquanto tu estás assim tão visível,
eu estou aqui no mais prazer:
sentir o meu corpo é sentir dor também,
porém eu acredito mais na próxima alegria.

- Nauseabundo!

Eu?
Apenas pelo motivo intrínseco
de que estou no meu pleno habitat,
com a minha própria excitação,
aquela que invejas no mais profundo horror,
porque não dá conta da sua e de
nenhuma outra

- Vilipendioso!

Cala teu sorriso, ele é hostil!
Não vou comunicar-me no teu linguajar:
tu não comandas minhas maneiras de agir,
estás a um canto, em mim, separado,
e que enquanto ficar aí parado, serás
humilhado, desprezado, odiado,
a ti somente,
porque eu estarei simplesmente feliz.

- Meliante!

É que tu te alimentavas da minha felicidade,
exatamente no ponto onde ela surgia pura
e cristalina,
porque foras plantado tão cedo, parasita,
no mais profundo pelo do animal,
onde te insurgiste nas minhas construções,
nas minhas bases, donde extraías minhas alegrias,
mas onde não estás mais, percebe:
não, ainda não me livrei de ti, cala-te outro,
tenho essa certeza, querido demônio,
porque és pior que o Diabo que logo faz e diz,
e vocês se nascem na nossa construção, cupins,
mas agora te proporciono o devido expurgo:
fica aí!

E fenecerás!
Posto que quase nunca vou te proporcionar a visão
de nenhuma dor, posto que não mais estás em mim,
tu morrerás de fome, inseto,
eu não mais sofrerei pelo motivo agora pouco
de ser feliz e tranquilo.
Tu te alimentavas daquela minha
diarréia emotiva.





Francisco José
09/06/2011


Imagem disponível em http://tinyurl.com/3faroxf em 09/06/2011

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Luz






- Matar baratas, como bem poderia ter dito Clarisse,
é a maneira mais simples e mais completa
de se experienciar a própria essência erótica
do assassinato, numa sua completa mística.

Mas qual, devolveria a própria Clarice,
é que você não teve a sorte de viver
para ver a era, mágica, em que as comidinhas
são vendidas com uns veneninhos
que as matam em sua necessidade primária
- a de comer.

Talvez qual, respondesse ainda Mourice,
que tal morte perpetrada assim,
nas pedras gélidas das escadas das catedrais,
chega a ser santa, santificada,
porque feita com o intuito muito perverso
de assassinar aquilo que lhe era um mal,
e a todo resto do mundo,
podia ser usada essa arma: o poder
-não importava ela fosse um ser vivo.

Responderia ainda, aquele que nome não deve ter,
que as mortes, todas, deveriam ser sequestradas
dos seus algozes que as pregam como um fim:
é exatamente o começo de um não saber, infinito.


Francisco José
08/06/2011


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domingo, 5 de junho de 2011

Tutankamon







Depois que a serpente esfriou o seu metal,
brotaram-lhe filhotes cíclopes que povoaram
seu arredores.

Coisa mais simples, brotar da casca, ávido,
descer da mesma, fincar num chão mais longe
sua bandeira,
e daquele chão fazer a sua morada,
e a dos seus, e dos seus.



Francisco José
05/06/2011

Imagem disponível em http://tinyurl.com/3zkawvs em 05/06/2011

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Desejo





Eu quero aquela poesia
escondida nos pavios das velas,
a que vem a tona na luz da chama,
e que sobe sumindo, na noite escura,
num fio de fumaça, que logo se expira.



Francisco Vieira
03/06/11


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quinta-feira, 2 de junho de 2011

As Rosas Não Falam








Estou voando profundamente
pelas imensidões abismais do desconhecido,
porque estas viagens me proporcionam conhecimentos.
A visão de particularidades, antes impossíveis de se imaginar,
me absolve de toda ignorância, naquele exato momento,
mas somente dentro dele,
porque o conhecimento é uma faísca
da qual guardamos apenas
uma opaca lembrança.



Francisco Vieira
02/06/11


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quarta-feira, 1 de junho de 2011

Samba de Viola




Mexer com palavras é preciso ser mágico:
tanto no cumprimento, quanto na largura,
resultando numa equação perfeita.
Isso tudo senão em meio de uma sinfonia exubélica
que tocasse Strauss, e Stravinsky,
entrecortados e simultaneamente
à aquarela de Ary Barroso.
Potenciamente enlouquecidos,
como o Universo, seus pedaços de buracos negros,
a engolir a realidade.
Felizes os ouvidos que os escutassem, um a um.

Tan tan tan tan!




Francisco Vieira
01/06/11

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Até pararem de tocar os violinos







Doce o encontro do beijo e o desejo,
dados pelo simples, pura atração,
vertendo ânsia magnética dos olhos entre si
e quando se entregam,
ah, explosão.

Uma onda fina e perene me liga a garganta a minha própria medula,
fazendo estalar, no céu da boca,
me explodindo o crânio em nano partículas
que por um momento se distanciam e então
voltam a ser osso, novamente, numa nova inspiração.

Até pararem de tocar os violinos.





Francisco Vieira
13/05/11


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quarta-feira, 11 de maio de 2011

Parágola




"Slanted eyes meet a new sunrise
A race of bodies small in size"
Siouxsie and the Banshees


Ás vezes eu falo entre as minhas próprias falas,
entregando o rio que de mim não deságua,
que se estabelece de maneira insegura nas margens,
que se extrapolem ainda assim das minhas mal arranjadas paredes,
que não têm limites, que não se contém, que vai se perder.

E qual, não me contive a alegria,
descobrir que ao dar-se ao nada,
passado o primeiro momento de susto da queda,
é poder ocupar um lugar melhor e mais amplo, e mais profundo.


Francisco Vieira
11/05/11


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sexta-feira, 6 de maio de 2011

O Poeta no Monte Sinai







Eu tenho nenhuma frase minha com um único e pobre significado
que lhe atribuir se possa,
na laje de um sentimento que se embasa na barriga,
extrapolando os limites que o ventre possa colocar
contra esta respiração forte que o expande:
num espirro em que o sujeito se dá a luz às entranhas,
que lhe engole de volta, num ciclo que lhe era antes de ser:
sorver profundamente a atemporalidade
daquele exterior que não me pertence,
numa força que veio lá de dentro do próprio ventre.

Por isso eu falo com tanta propriedade!
Meus cálculos se insinergem por aí, se arrumando, acomodando,
até que se acalmem e se as ondas se vão
deixando plácido o lago, límpida a face,
congelando o fio do aço que vai moer, finamente,
a ideia transmitida pelas palavras ditas no papel.

Enquanto o machado se prepara para o golpe final,
o toque da pluma atraída pela eletricidade negativa da pele,
derruba o ataque, reconstrói a atitude.



Francisco Vieira
06/05/11


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domingo, 10 de abril de 2011

Anis








Se houvesse uma superfície sensível ao movimento, e que desse espaço de papel limpo à minha letra, assim que ela se escrevesse, que pudesse perceber as oscilações na minha velocidade, e respeitasse esse tempo, parando, seguindo, a minha caligrafia seria perfeita na escrita dessa carta de amor. Porque o sentido que imprimo na minha caneta, inclusive a pressão, o estremecimento por dentro do controle da mão, hesitação, excitação, são o que dizem estas poucas letras: estou te amando. Não que amanhã não vá continuar te amando... um ponto de vista estratégico, monitorado e pretensamente enganadíssimo perante a espera de uma vitória certa. Que se espatifará pelo chão, tão logo confrontada. Sou eu assim, perante você: um herói que custa manter suas conchas contra seu corpo geléico, de pé, sustentado pela força desse amor, que enfrenta-o da mesma altura. Ainda que. (Aqui uma pincelada à Van Gogh.) Ainda que eu falasse com as rosas, não falava com nada tão meigo quanto você.




Francisco Vieira
10/04/11


Imagem disponível em http://tinyurl.com/3kccfco em 10/04/11

sábado, 9 de abril de 2011

Proteção








Cheiro de sabonete amolecido no cocho.
Alguém banha o corpo nas redondezas.
Um corpo completamente entregue nu, à água que lhe escorre.
Aqui estou, e o banho já está no fim, e o escorrer da água cessando,
revela que ele já absorveu tanto, e está tão limpo,
que pode terminar tanta cessão de prazer.
A toalha desliza surda pelo corpo úmido,
não ouve o som do atrito contra esse corpo,
contemplativa que está ante a maciez desta pele.
A tolha pendurada no seu cabide, arrumada,
completamente encharcada de tanto líquido
daquele corpo honesto, morno, cujas intimidades ela conheceu,
se entrega ao peso da saciedade que se abate sobre seu corpo.
Fechado, úmido, nebuloso, escuro, deliciosamente cheiroso,
o banheiro é fechado, lacrado, com toda aquela sensualidade
lá dentro.


Francisco Vieira
09/04/11

Imagem disponível em http://tinyurl.com/3ncdntr em 09/04/11

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Nain








Há demônios que não são meus,
eu os trago parasitas que os recebi de criança,
e é preciso que eu os mate, se não quiserem me abandonar,
para que possam chegar meus próprios elementais
que seriam de longe muito melhores.

(A turmalina gira sua translação de 12 graus,
os unicórnios nus vêm receber a nova luz, que se abre.)

Foi preciso que eu deixasse a luz entrar em mim,
para que eu visse claramente as trevas mais distantes.


Francisco Vieira
06/04/11


Imagem disponível em http://tinyurl.com/4x54y6e em 06/04/11

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Presença Perdida








Cheirei a camisa, não tinha seu cheiro.
Parte de mim queria-o, até que para maldizê-lo.
Você foi e nem a doçura dos seus olhos eu quis guardar,
nem o aconchego forte nos seus braços, dos abraços
duradouros, mornos, suaves seu lábios premendo os meus.
Aquele teu cheiro de roupa limpa, de coisa boa,
que eu procurava tanto sorver, quando me faltava teu hálito.

A camisa não tinha teu cheiro, nem essa lembrança toda.
Até que para maldizer tua presença, antes precisava lembrar.
Houve um momento em que eu realmente me entreguei,
quando quedei sobre teu ombro, na tua roupa limpa, clara,
e respirei, vagarosa e profundamente, teu cheiro de bondade.
Aquele teu cheiro de alma limpa, de índole boa,
que eu procuro tanto achar, quando me falta o que inspirar.




Francisco Vieira
04/04/11


Imagem disponível em http://tinyurl.com/6xwl6an em 04/04/11

quarta-feira, 30 de março de 2011

Algodões de Mármore






Ao Rafael Valim




Eu vivo livre pela vida até achar alguém que me cative.
Tomara que não tente me segurar, para que eu volte outras vezes...

(Tomara que eu rompa as fronteiras da loucura, num espirro de luz açucarada,
fazer fios na paisagem além que agora eu alcanço,
e retornar para o centro mais profundo de mim,
agora um pouco mais expandido, aveludado,
onde eu posso gozar de mais conforto e segurança.
E doçura.)




Francisco Vieira
30/03/11



Imagem disponível em http://tinyurl.com/4f7b6rm em 30/03/11

domingo, 27 de março de 2011

Encruzilhada (Peça para piano)



Aos meus amigos da Bioenergética



Eu quero a alma das rosas para me encantar,

aquelas que suspiram em plenitude,

depois de enfeitar, desafiando a luz, a dar-lhe cor,

depois de surgir do caule verde, espinhoso,

numa manhã em que o sol se espreguiçasse rosa,

e as gotas epifitamente penduradas nos gomos

do cálice se rompendo, na força da cor, que emergia na luz,

toda ela se escapando, feita de carne, em pétalas.



Francisco Vieira

27/03/11

Imagem disponível em http://tinyurl.com/6yjgxjv em 27/03/11


quinta-feira, 3 de março de 2011

Umidade







Aguardamos o seu contato.
Na caverna mais escura, na mata tépida,
sob uma chuva finíssima, oleosa,
com os dedos cravados no deszelo:
a apavorante figura que cresce na parede
é a minha sombra rusticamente projetada,
bruxuleando no fundo do côncavo na rocha.
E eu descobri.

Diante de tal verdade impressa na minha carne,
que mais posso fazer aqui, só por diversão?
Por baixo do poço há de a água fluir, surgindo
das entranhas cheias da terra que transborda,
não se contem e extravasa, mililitricamente ocupando a superfície.

Francisco Vieira
03/03/11


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quarta-feira, 2 de março de 2011

Adeus





Adeus

A
Daniel Bezerra Gomes



Eu sentado sobre a pedra no caminho que nos surgiu,
durante a nossa caminhada, para que me amparasse,
do tapa de te ouvir dizer a própria boca o “Fica!”
porque não me queres mais, peso que me tornei a ti.

São lágrimas com areia de rio que eu choro doidamente,
que me escorrem pelo colo erodido, assoreado,
que não se calam impulsionadas com a pressão
de um grito que não pode nem quer se calar,
mas que também não vem à tona,
nascido no fundo do ventre do ser côncavo, de vazio,
desprovido de pele, gelatina escorrendo sobre a pedra.

Mas ainda há de passar um beija-flor
e provar, levando consigo,
do doce açúcar em que me derreti.


Francisco Vieira
02/03/11


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quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Sinovial








As pessoas algumas tem uns mistérios,
mistérios nem sempre sabidos, nem sempre descobertos,
mas para os quais não encontram ação possível remediadora,
nenhuma medida que possa responder às perguntas,
gritadas no silêncio,
e tornar isso público é uma nota a mais na malevolência.

Os pássaros entrechocam-se, às vezes, em pleno vôo
e saem, tontos pelo encontro tropeçado, no ar,
desbarrancado, sofista, elegante.

As pessoas, somos tristes, puras perguntas carnais
andando pelos acostamentos, sangrando,
esperando o caminhão que virá na mesma velocidade contrária,
como resposta definitiva a velocidade angustiada
da sua pergunta.

As pessoas tendem a uma visão mais segura da coisa,
quando descobrem na morte a oportunidade para viver de outra maneira.
Mesmo que isso quebre ovos, e ossos, e moa as cartilagens, dói.
A separação do que é nefasto entre o que é íntegro.

Francisco Vieira
24/02/11



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quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Fala do mestre sobre a pedra






Enfim alguém pode dizer mesmo que
viu o outro feliz quando, o adulto de hoje,
enternecido, cheio de compaixão e amor,
acolhe a solidão daquela criança que ele foi,
dando a ela, finalmente, o lugar merecido
entre os braços seguros que a amam.


Francisco Vieira
23/02/11


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I’m the Passenger







Está acontecendo alguma coisa atrás de mim,
e eu sinto que posso ser atingido, a qualquer momento,
embora uma voz, muito grave, assertiva, afirme
que não.

Mas é que escuto risadas, que podem ser de mim,
do meu jeito de ter lidado com as coisas,
sentimentos guardados, e agora libertados,
porque se sentiram vencedores, na sua pobre
vigilância, recompensada, com a visão de um deslize,
embora a voz declare que não.

-mas aquela visão seria com a qual estamparia,
meu álbum nas tuas memórias,
e colocado na tua mais esquecida prateleira,
depois de outros retratos horrorosos,
e a voz me desmente mais uma vez.

Sim, eu sei, eu sigo adiante,
e nem o medo de que possa ficar, inclusive,
sem os vossos olhos que me desvêem,
porque eram os únicos que eu via até então,
e os quais declinara ver, antes nenhuns,
e fui em busca da minha cegueira definitiva.

Sim, eu respondo à voz, porque me deseja,
vamos, porque no fundo eu sei,
pois essa voz, muito grave, assertiva, afirma,
- isso é um desejo secreto e guardado –
nada disso pode estar acontecendo,
naquilo que ficou para trás de mim,
um personagem que não mais cabia em mim.

E a voz diz ainda que a imagem da fotografia
foi um requinte de perspicácia
- como não concordar?



Francisco Vieira
23/02/11


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sábado, 19 de fevereiro de 2011

Ode Vox







As lógicas errantes das nossas discussões
eram infundadas e delirantes,
porque discutíamos sobre coisas que não víamos.

Era impossível assistir a mesma lógica,
por ti descrita, na paisagem que eu observava...
porque enquanto olhavas para cá,
eu olhava para lá.

Não que alguém de nós precise pagar sozinho
o peso de carregar o fim,
a aridez que se abate de repente sobre as orquídeas,
e as rosas, e as deixa tão cinzas, finas,
quanto as que se ameaçam abater sobre nossos corações.

Não é justo que um seja declarado culpado
da nossa culpa em comum

- mesmo porque o peso de ser culpado
será tão pesado quanto o peso
de ter sido injustiçado, em algum ponto.


Francisco Vieira
19/02/11


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terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Fábula VCXII








Eu abandonei tua casa pelas portas do fundo,
como um ladrão, fugitivo que era da tua força de comando,
que dormia atrás da porta da frente.

E foi uma lufada de brisa doce, úmida e fria
que despertou o carrasco de que o rato, que ele mantinha,
havia buscado as paragens escuras e sombrias da noite.

E quanto luminosos para o fugitivo errante,
pulmões cheios de esperança,
pareceram aqueles caminhos desconhecidos, excitantes!

Na porta dos fundos, sob a luz pálida e mágica, olha o raptor,
pela imensidão das árvores que cegavam qualquer luz na escuridão,
debruçado sob o peitoril da própria covardia por sair...


Francisco Vieira
15/02/11


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segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Dropp








A nuvem escura que chegou a estacionar
por sobre o meu telhado,
já vai embora de mãos dadas com a brisa,
que insinuou-se, constantemente, lhe fazendo a corte.

A nova luz que chega, seja bem-vinda!


Francisco Vieira
14/02/11


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sábado, 12 de fevereiro de 2011

Vida I





A Ana Carolina Ferreira

Eu queria outra vida:
uma vida angustiada, lutada, sofrida, dramática,
trocada por outra cheia de felicidade,
que os outros fossem raros momentos,
e sempre houvesse a alegria constante de
uma solução completa para cada dificuldade de antes...

uma vida que sempre tivesse sido toda planejada para o feliz,
toda construída por sobre momentos felizes e tijolos de ouro,
com cores por todos os lados, maciez, fluidez, qualidade, amor...
onde você pode ter a experiência mística de olhar a possibilidade
de múltiplas formas, ver outros sentimentos possíveis, escolher,
e então depois chorar profundamente, mas por felicidade...

Francisco Vieira
12/02/11


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sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Nó na Madeira







A João Nogueira e Ataulfo Alves

“...É a paga da praga que eu vou te rogar, devagar...”




Sou nó na madeira, um desvio de conduta dentro de um ser harmonioso,
um erro “na cadência bonita do samba”, ritmada, erudita,
um perfume de jasmins cortado por um fio de esterco irritante,
uma coxeada, uma cochilada, uma falha – um crime,
“de chinelo novo brinquei Carnaval, Carnaval”
eu que não me arvorei querer ser melhor que eu mesmo.


Francisco Vieira
11/02/11

Assistam:
http://www.youtube.com/watch?v=GYr8nwx68Jc
http://www.youtube.com/watch?v=pjmPhPbT4ls



Imagem disponível em http://tinyurl.com/4zlal86 em 11/02/11

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

The killing Jar






As jarras gargalhavam, na sua pontencialidade digna
dos conteúdos gélidos que as faziam suar, na encruzilhada,
jogando os corpos para trás, cujos cabelos seguem o movimento
em meia lua brilhando, cada fio, em cada onda em cascata.

E por que na encruzilhada, o passante descuidoso lançará a pergunta,
a qual será respondida, numa gargalhada tátil,
escorrendo nos pelos do teu corpo, emitindo notas inaudíveis
de prazer, de riso descontrolável e descontrolante destino, ela dirá,
numa expressão de enigmático e despretensioso riso vespertino,
perguntará ‘o que tem a encruzilhada de mais?’

Francisco Vieira
10/02/11


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Balloons






E se perpetra o crime de aprisionar Hélio
num compartimento de borracha colorida, com muito cheiro,
se amarra um cordão na ponta dos mesmos, sob o nó,
e com esse sequestro se comemoram acontecimentos e datas festivas.

Acontece que tal material torna-se poroso, ou pela presão,
que o estica ao ponto de se romper em alguns pontos distintos,
ou se os átomos vão cavando por si só janelas no látex,
e o Hélio vai se escapando, por entre nitrogênio e hidrogênio,
subindo à estratosfera, lugar onde, definitivamente, mora.

Porém se alguma criança, mesmo adulto, liberta o cilindro pelo ares,
o gás inteiro entra na velocidade junta de todos unidos em pressão,
e se alça cortando o ar vulgar que o aprisiona nas profundidades,
sem nenhum rancor, então, passa pela torre mais alta da Igreja, e beija,
já que só tem valor a ansiedade da viagem e da chegada, e a sensação
de se pertencer ao todo - não há quem não grite.





Francisco Vieira
10/02/11


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quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Visitor






Eu sou a sombra daquilo que eu não era.
E fui chegando em mim, tomando meus limites,
construindo outros mais profundos, mais abertos,
deixando de caber naquele corpo que se adequou todo,
a minha alma, e cresceu, alçando alturas nunca antes tão altas!

Porém eu nesse corpo novo não caibo em muitos lugares,
onde costumava estar, passar, e há sentimentos e
desejos tão diferentes daqueles de antes que, meu coração,
herói de toda a minha constituição física e mental,
precisou sofrer, de alguma maneira, para se adequar
a essa nova e deliciosa etapa de sentir.

Francisco Vieira
09/02/11


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segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Máquina Procela









No meu novo mundo eu vejo a todos
não do jeito que eles querem que eu os veja,
por trás das máscaras que já aprendi identificar.

Mal coladas, mal dispostas, trocadas, síndromes construídas,
eu vejo seu sofrimento debaixo da escuridão da sua vergonha.

O rosto mais triste e machucado que se me apresentou,
sem nenhuma máscara foi o que me chamou em silêncio,
por trás daquela formalidade mais fria, de onde fomos embora...



Francisco Vieira
07/02/11


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domingo, 6 de fevereiro de 2011

Oração a Santa Luzia







Olhar-te através de um espelho, porque não posso
encarar-te frente a frente, eu que nunca me tenho visto.
Eu não existo pelas arestas – a par, de todo o mar,
que é possível se imaginar existir pelas frestas,
e meus símbolos pessoais são inescritos.
No meu reflexo que há pouco estou aprendendo usar,
na minha personificação plástica corpóreo-consciente,
eu ainda não me acostumei comigo, desde que me foi dado
ser olhado longamente.
Por que olhas, em fim, para mim, que a muito custo posso suportar
tanta benevolência, tanta certidão de mim mesmo
como ser bom, digno desse teu olhar intercursado,
cheio de afeto primitivo, de acolhimento, de paixão!

O vício é o eterno reflexo daquilo que nunca foi visto.



Francisco Vieira
06/02/11




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sábado, 5 de fevereiro de 2011

Báscula







São os minutos, e não as horas, os responsáveis pela
amizade tão íntima com a tua própria sombra,
porque ficais tão próximos.
Ali achas os responsáveis pela tua situação tão frágil,
a tua constituição quebrada, caída, remontada,
todos vagando contigo na tua própria casa,
onde não tens o teu próprio ambiente em paz.

Queres as horas longes, embora saiba que elas também
não têm tudo...
aqui incomoda demais esse estado de mutilação e sufoco,
vai para os segundos...

Lá os estados não se diferenciam muito, e não os sentes tanto,
então há tempo suficiente para pensar com mais clareza,
e estabelecer uma meta entre os tempos para cima,
assim como para baixo.


Francisco Vieira
05/02/11




Imagem http://tinyurl.com/4bzv6r7 em 05/02/2011.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Origem






Às vezes, meu pensamento flui com a velocidade de uma Desdêmona
entre intrincados caminhos, entre labirintos úmidos e febris,
parafraseando cada frase que escuto, cada música que ouço,
dançando qual bola ciclista nos túneis do tempo, arredondados...

nada me veste, a não ser o resultado da simples equação euXtu
deixando-me assim, nu, perante os varais ascensionados da imensidão,
onde eu percorro com todo prazer o meu próprio caminho,
que há de se encontrar com o teu, mais à frente...

mas foi porque não coubesse mais no teu colo interno, de sangue e cal,
que me expulsastes, já respirando e desejando tuas tetas,
que me davam resultado a uma ânsia que eu não sequer conhecia,
o teu leite foi o meu cúmplice no desenvolvimento de mim mesmo.

Doce terra firme tórrido torrão de solo a sustentar meus passos cegos
na hesitante, frágil, de carne existência do meu eu fora do teu corpo,
os teus braços construíram-me consciência da minha espinha dorsal,
que haverá de me sustentar durante toda a vida extra uterina.

Mas é tão bom voltar a tua casa, já no entardecer, sol laranja,
onde, me esperando, a tua benévola maternagem sobre a mesa disposta,
o colo aberto, sorriso acolhedor, e o amor de que te mamo, dos olhos,
quando então dizes, num fim de suspiro: “meu filho!”


Francisco Vieira
01/02/11

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segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Nos degraus mais fundos






Eu já andei no escuro, absoluto escuro,
que apenas podia ser cortado toscamente,
por uma chama desiludida no meio do, absoluto,
escuro da luz das estrelas cinza chumbo...

era quando a noite realmente entrava em nós,
e brincávamos de esconder pelos vãos de luz,
que nos possuía e então éramos comuns a toda treva,
que se fluía dentro de nós e ia embora,
sempre que a escuridão abrisse de novo os nossos corpos...

sinto falta de outra escuridão que ficasse e não esta que está,
que não se muda, não vai embora, que insiste em ficar
a despeito da minha vontade... preciso dessa escuridão,
onde eu possa aí me desnudar, me entregar!

Francisco Vieira
24/01/11

Galeria




Hoje eu quero a rosa mais branca que houver,
quero colhê-la nas primeiras horas da manhã,
ainda entre-aberta, quero essa vibração dela
que está se dando à luz e ao calor,
quero essa sensação.
Vou buscar no riacho próximo, no ponto
onde a água é mais pura,
encher minha jarra de barro,
com o cuidado de quem toca no sagrado.
Quero assear meu corpo, limpá-lo,
purificando ao máximo, unhas e cabelos aparados,
perfumar-me de mangericão, alecrim, e colônia,
então vestir roupas leves de algodão, branquíssimas.
Para ajoelhar-me descalço frente ao Ibá, com a alegria e satisfação
de quem se paramentou para estar na presença do Rei de Ejigbô,
tendo atravessado todo o deserto por horas,
sem trazer nenhum grão de areia, nenhuma gota de suor,
mas dourados os cabelos, rosa branca na mão,
para falar da minha tão enorme gratidão...

Francisco Vieira
24/01/11

domingo, 23 de janeiro de 2011

Werther, 2.011





O amor é um dos poucos sentimentos
que podemos compartilhar despreocupadamente.
Os outros sentimentos, não precisam.
É então quando se abrem os precedentes, um a um,
todo grão vai sendo triturado, pela pedra do moinho.
Enfiar dois campos léxicos no mesmo radical,
isso é quase como fazer clonagem humana!

Quero desplugar.

Ameaçar jogar-me no precipício, gozar,
a tensão minha e dos outros, o medo, o frio
gélido no seio das vísceras, na barriga, esse medo,
se transforma no êxtase (o corpo se esvazia da alma) ,
que me dilacera de emoções, no encontro com a pedra.


Francisco Vieira
23/01/11

sábado, 22 de janeiro de 2011

Deus






To create a universe
You must taste
The forbidden fruit.

Sugarcubes




Estou servido cada parte de todo o meu corpo
através das tigelas dispostas ao longo do balcão,
self service e clichê.
Encha sua casquinha de bocados de mim, um fígado, um rim,
e depois me cubra-os de calda de chocolate, que não são mais meus,
e mastigue-os, junto a bocados de marshmallow, jujubas,
mastigue o que eu não mais consegui reter para mim.


Francisco Vieira
22/01/2011